Luci Afonso
Após quatro anos, três meses e dezoito
dias, resolvo começar a fisioterapia indicada pela neurologista. Antes, porém, tenho
de fazer uma avaliação.
Minha mãe avisa:
— Vou também, para você não desistir.
— Não precisa.
— Precisa, sim.
Com cinquenta e dois anos nas costas, sou
conduzida por uma velhinha de setenta e quatro, com 20% de visão no olho
esquerdo, zero de audição em ambos os ouvidos, 80% de entupimento na coronária,
hipertensão e diabetes.
— Veio trazer a nenê? — brinca a recepcionista.
— Vim.
A terapeuta é gentil e atenciosa, mas
tenho dificuldade em abordar o problema. Minha mãe ainda não acredita no
diagnóstico.
— Não tem lógica — ela argumenta.
— Por que não, mãe?
— Porque Deus é justo. Não ia te mandar essa
merda.
Justo ou não, descobri que tenho uma
doença incurável, mas não fatal, e que exige diversos cuidados.
Terminada a avaliação, agendo dez
sessões, a primeira já amanhã.
— Você quer que eu te traga?
— Pode deixar, mãe.
— Você vem sozinha?
— Venho.
— Vem mesmo?
— Juro pela senhora.
Na tarde seguinte, ao descer para pegar
o táxi, encontro-a sentada na portaria.
— Eu não tinha nada para fazer. Quero
ver como é essa tal de fisioterapia — ela dá a mesma desculpa nas nove vezes
seguintes.
No amplo salão cercado de vidro, um
bando de velhinhos trêmulos exercita braços, mãos, pernas e pés atrofiados. Lá
fora, outros fazem hidroterapia na piscina aquecida. O clima é de intimidade e
animação. As mulheres trocam receitas ou falam sobre os netos. Os homens
discutem política ou futebol e olham discretamente o corpo jovem das
fisioterapeutas, realçado pelo uniforme de malha colante.
No espaço reservado aos acompanhantes, à
beira da piscina e com vista para o salão, há cadeiras confortáveis e uma mesa
com chá, café e biscoitos. Minha mãe escolhe um lugar à sombra, serve-se de
café e começa o bate-papo com alguém próximo. Às vezes, aponta para mim,
orgulhosa. Quando não está conversando, apenas me observa.
A sessão tem início com vinte minutos de
analgesia, propiciada por deliciosos choques elétricos de baixa intensidade na
parte direita do corpo. Seguem exercícios de alongamento e reabilitação
muscular, que, acabo de descobrir, só terão resultado a longo prazo. As primeiras
dez sessões vão se desdobrar em dez, outras dez, mais dez — a marca dos cem não
é novidade por aqui. Felizmente,
paciência é o meu ponto forte.
Ao final, minha babá comenta:
— Esse tal de Parkinson não te vence, filha.
Enquanto ela estiver ao meu lado, sou
mesmo invencível.
Agosto de 2012
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