Luci Afonso
Andamos lado a lado na praia
vazia, catando as raras, minúsculas conchas trazidas pelo mar. Hoje faço
cinquenta anos. Ela tem setenta e ainda cuida de mim:
— Movimenta o braço! Pisa na
água! Cadê a bolinha?
Ela insistiu muito para que eu
viesse nesta viagem. Providenciou reservas, passagens, estada. Andou de avião
pela primeira vez, para que pudéssemos ficar vinte dias em Guarapari, conhecida
pelas propriedades medicinais das areias monazíticas. O atual nome da cidade,
que significa “armadilha de pássaro”, e o antigo, “garça manca”, são adequados
à minha situação.
— Você precisa se mexer, sair do
lugar! — ela incentiva.
Estas férias são minha última
esperança de retomar a vida normal. Após o diagnóstico, sinto muito desânimo e
saio pouco. Não dirijo mais, só ando de táxi ou carona. Não me adaptei aos
remédios, não comecei a fisioterapia, não estou fazendo atividade física, que
supostamente me traria bem-estar. Não, não, não. Continuo me perguntando: por
que eu?
— Cansou? Senta aí na água e
enfia a mão na areia. Vou buscar uma água de coco.
Os turistas começam a chegar,
entre eles, minha irmã mais nova, seus filhos e o meu, os três adolescentes.
Trazem barracas, cadeiras, caixas de isopor. Os ambulantes já circulam,
oferecendo produtos inimagináveis.
— Olha que linda a tatuagem! Você
vai no caiaque ou no banana boat
primeiro? Espera que eu vou tirar sua foto.
Vejo um casal de velhinhos se
preparando para o banana e me arrisco
a acompanhá-los. (Ouço a mulher dizer ao companheiro: quero experimentar tuuudo!) Somos rebocados até a lancha, que vai
atingindo velocidade à medida que se distancia. Os velhinhos riem alto enquanto
somos sacudidos pelas ondas. Esqueço por um instante minhas preocupações e
descubro que estou viva. O vento, a água, o sal, o sol... viva!
A silhueta esguia me acena da
praia. Na volta, ando de caiaque, faço uma meia-lua de henna no tornozelo e
enfeito o cabelo com trancinhas de tererê. Provo também o espetinho de peroá e
o pastel de bacalhau. Estou... viva. Quero... tudo.
— Você vai ficar boa — ela
garante, depois de massagear meus pés à noite. (Te amo, mãe. Eu também, filha, pensamos.) Ela ajeita a coberta e
apaga a luz, acariciando o ventre morno que ainda me abriga. Amanhã
caminharemos de novo na areia aquecida pelo primeiro sol. Não desisto. Quero
voar.

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